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CÓDIGO CIVIL INTERPRETADO

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Telhado construído sem espaçamento do muro divisório dos terrenos dos litigantes - Inobservância do art. 1.301 do CC/2002 - Demolição da parte excedente - Possibilidade. Inobservado o disposto no art. 1.301 do Novo Código Civil, cabe, inicialmente, adequar a obra ao comando legal ou, se assim não for possível, demoli-la, pois segundo o testilho legal retro enumerado: "Art. 1.301. É defeso abrir janelas, ou fazer eirado, terraço ou varanda, a menos de metro e meio do terreno vizinho. §1º As janelas cuja visão não incida sobre a linha divisória, bem como as perpendiculares, não poderão ser abertas a menos de setenta e cinco centímetros. §2º As disposições deste artigo não abrangem as aberturas para luz ou ventilação, não maiores de dez centímetros de largura sobre vinte de comprimento e construídas a mais de dois metros de altura de cada piso". Conheça um pouco mais sobre o Direito de Construir no atual Código Civil, fazendo a leitura do v. acórdão abaixo transcrito, destacando-se pela sua fundamentação e trazendo a aplicação de inúmeros dispositivos da Lei Adjetiva Civil ao caso submetido a julgamento, notadamente o fato de a conclusão da obra em data anterior ao ingresso da ação de nunciação de obra nova, não impedir o prosseguimento do feito, se cumulado pedido demolitório.

Data: 15/03/2007 Acórdão: Agravo de Instrumento n. 2005.018677-6, de Fraiburgo.
Relator: Des. Wilson Augusto do Nascimento.
Data da decisão: 07.10.2005.

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE NUNCIAÇÃO DE OBRA NOVA CUMULADA COM DEMOLITÓRIA E INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS - PRELIMINAR - CARÊNCIA DE AÇÃO - OBRA CONCLUÍDA QUANDO DO INGRESSO DA DEMANDA - CONVERSÃO DA AÇÃO DE NUNCIAÇÃO EM DEMOLITÓRIA PELA JUÍZA SINGULAR - CARÊNCIA DE AÇÃO AFASTADA - MÉRITO - ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA - REQUISITOS PREENCHIDOS - INTELIGÊNCIA DO ART. 273 DO CODEX INSTRUMENTALIS - TELHADO CONSTRUÍDO SEM ESPAÇAMENTO DO MURO DIVISÓRIO DOS TERRENOS DOS LITIGANTES - INOBSERVÂNCIA AO ART. 1.301 DO CÓDIGO CIVIL - DEMOLIÇÃO DA PARTE EXCEDENTE - POSSIBILIDADE - PERIGO DE IRREVERSIBILIDADE DA MEDIDA NÃO EVIDENCIADO - PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO - NÃO OBRIGATORIEDADE - EXEGESE DO ART. 804 DO CPC - DECISÃO MANTIDA - AGRAVO NÃO PROVIDO.
A conclusão da obra em data anterior ao ingresso da ação de nunciação de obra nova, não impede o prosseguimento do feito, se cumulado àquela pedido demolitório.
Possível a demolição de parte do telhado construído pelos agravantes se, desrespeitando o espaçamento mínimo do terreno dos agravados, houver risco de dano ao imóvel destes, forte nos arts. 1.301 do Código Civil e 273 do CPC.
A determinação de caução, fulcrada no art. 804 do Codex Instrumentalis não é obrigatória, cuja fixação dependerá do caso concreto, ficando a critério do magistrado, dado seu poder geral de cautela.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de agravo de instrumento n. 2005.018677-6, da Comarca de Fraiburgo, em que são agravantes Renato Olivo e Aparecida Olivo, e agravados Francisco de Matos e Neusa Dometila Chaves de Matos:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, afastar a preliminar argüida e, no mérito, negar provimento ao recurso.
Custas na forma da lei.

I -RELATÓRIO:
Renato Olivo e Aparecida Olivo interpuseram agravo de instrumento, inconformados com a decisão interlocutória proferida pela MM. Juíza de Direito da Vara Única da comarca de Fraiburgo, a qual deferiu pedido de antecipação da tutela formulado nos autos da ação de nunciação de obra nova cumulada com pedido demolitório e indenização por perdas e danos, ajuizada por Francisco de Matos e Neusa Dometila Chaves de Matos.
A magistrada deferiu a antecipação da tutela requerida, determinando a demolição de parte do telhado do imóvel dos réus, a fim de que seja mantida a distância de um metro e meio do muro divisório dos terrenos das partes, a evitar o escoamento das águas pluviais no imóvel dos autores (fls. 53/56).
Os agravantes requereram a reforma da decisão, argüindo preliminar de carência de ação, por perda do objeto, pois proposta a demanda após a conclusão da obra.
Aduziram inexistir razão da determinação à demolição do telhado, porquanto possível a regularização da edificação.
Alegaram haver perigo de irreversibilidade da medida, bem como não ser possível o deferimento do pedido, sem exigência de caução, eis que ausente oitiva da parte contrária.
Requereram o conhecimento e o provimento do recurso, acolhendo-se a preliminar argüida e, no mérito, reformando-se a decisão agravada (fls. 02/05).
O efeito suspensivo almejado foi negado (fls. 63/64).
Em resposta ao recurso, os agravados sustentaram a ilegalidade da obra, a justificar a demolição (fls. 68/70).
Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

II -VOTO:
Trata-se de agravo de instrumento interposto com o desiderato de ver reformada a decisão interlocutória proferida nos autos da ação de nunciação de obra nova cumulada com demolitória e indenização por perdas e danos, na qual o magistrado deferiu a antecipação da tutela requerida.

1. Carência de Ação
Argüíram os agravantes preliminar de carência de ação, por ausência de interesse processual, porquanto já concluída a obra, ao tempo da propositura da presente ação.
A análise da questão pelo Tribunal ad quem é possível, por tratar-se de matéria de ordem pública, apreciável, portanto, em qualquer tempo e grau de jurisdição.
Ingressaram os agravados com ação de nunciação de obra nova cumulada com demolitória e indenização por perdas e danos, na qual a magistrada, verificando estar a obra concluída, ao tempo da propositura da demanda, determinou a conversão da mesma em demolitória, medida acertada, dada a cumulação dos pedidos.
Portanto, indubitável a possibilidade de prosseguimento do feito, porquanto, em que pese já concluída a obra, necessária a análise do pedido demolitório, motivo pelo qual não há que se cogitar da carência de ação.
É da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
"PROCESSO CIVIL. NUNCIAÇÃO DE OBRA NOVA. PEDIDO DE DEMOLIÇÃO. PRETENSÃO DEMOLITÓRIA MANIFESTADA EM AÇÃO DE NUNCIAÇÃO DE OBRA QUE SUBSISTIU INTEGRA, ASSUMINDO CARÁTER AUTÔNOMO, NÃO SE DIVISANDO OFENSA A DISPOSITIVOS DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL NA DECISÃO QUE DETERMINOU O PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECURSO ESPECIAL DE QUE NÃO SE CONHECEU." (REsp n. 44182/SP - Rel. Min. Costa Leite)
Neste diapasão, colhe-se dos julgados deste Egrégio Tribunal de Justiça:
"Ainda que a obra esteja estruturalmente concluída, havendo pedido de sustação da mesma cumulado com demolição, deve a actio prosseguir com a apreciação deste último pedido." (ACV n. 97.004513-1 - Rel. Des. Carlos Prudêncio)
E: "'Embora terminada a obra, é possível o prosseguimento da ação de nunciação de obra nova se houve cumulação da sustação com pedido de demolição' (RT 576/62)." (ACV n. 99.001044-9 - Rel. Des. Newton Trisotto)
Destarte, a conclusão da obra, em data anterior ao ingresso da ação de nunciação de obra nova, não impede o prosseguimento do feito, se cumulado àquela pedido demolitório, razão pela qual se afasta a prefacial argüida.

2. Mérito
No mérito, requereram os agravantes a reforma do decisum, alegando, em síntese, inexistir razão à demolição da obra, eis que possível sua adequação ao disposto na norma legal; ser irreversível a medida, bem como necessária a prestação de caução. 2.1. Adequação da Obra
No tocante à possibilidade de adequação da obra, ao preceito insculpido no art. 1.301 do Código Civil, ao invés da sua demolição total, observa-se que, interpretando-se o decisum agravado, não há ordem de demolição da benfeitoria, mas, apenas, de que deverá observar-se o disposto na aludida norma.
Extrai-se da decisão atacada:
"Presentes os requisitos legais defiro o pedido de antecipação da tutela para determinar a demolição da obra para que atenda o disposto no art. 1.301 do CCB, ou seja, para que a construção da parte ré mantenha a distância de pelo menos um metro e meio do terreno dos autores, em 15 dias." (fls. 55/56) (grifou-se)
Prescreve o art. 1.301 do Código Civil:
"É defeso abrir janelas, ou fazer eirado, terraço ou varanda, a menos de metro e meio do terreno vizinho.
§ 1º As janelas cuja visão não incida sobre a linha divisória, bem como as perpendiculares, não poderão ser abertas a menos de setenta e cinco centímetros.
§ 2º As disposições deste artigo não abrangem as aberturas para luz ou ventilação, não maiores de dez centímetros de largura sobre vinte de comprimento e construídas a mais de dois metros de altura de cada piso."
Portanto, caberá aos agravantes, primeiramente, adequar a obra ao comando legal ou, se assim não for possível, demoli-la.
2.2. Irreversibilidade da medida
Relativamente à alegação de irreversibilidade da medida, a mesma não merece prosperar, porquanto possível a reconstrução do telhado, caso venham a ser julgados improcedentes os pedidos iniciais formulados.
Trata-se de obra simples, não complexa, razão pela qual não há que se cogitar de irreversibilidade da medida.
2.3. Caução
Afirmaram os agravantes ser obrigatória a caução ao deferimento da medida liminar.
Destaque-se, inicialmente, estar a caução prevista no processo cautelar, cujas disposições são aplicáveis ao procedimento especial, a possibilitar a análise da matéria.
Reza o art. 804 do CPC:
"É lícito ao juiz conceder liminarmente ou após justificação prévia a medida cautelar, sem ouvir o réu, quando verificar que este, sendo citado, poderá torná-la ineficaz; caso em que poderá determinar que o requerente preste caução real ou fidejussória de ressarcir os danos que o requerido possa vir a sofrer." (grifou-se)
Da leitura do dispositivo supra, não há dúvida, a determinação de caução não é obrigatória, cuja fixação dependerá do caso concreto, ficando a critério do magistrado, dado seu poder geral de cautela.
Ademais disso, a caução serve a garantir eventual ressarcimento aos agravantes, pelos prejuízos que por ventura venham a sofrer, caso rejeitada a pretensão dos agravados.
Sobre a matéria, doutrinam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery:
"A fim de garantir a efetiva indenização dos prejuízos que eventualmente o requerido venha a sofrer, nos casos enumerados no CPC 811, o juiz pode determinar a prestação de caução como condição para a concessão da liminar." (Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 1091)
In casu, prescindível a fixação da caução, dada a visível irregularidade da obra edificada pelos agravantes. Tal fato restou confirmado quando do rebaixamento do telhado, promovido por estes, a fim de não danificar o imóvel dos agravados.
Extrai-se dos julgados do Superior Tribunal de Justiça:
"CAUTELAR. SUSTAÇÃO DE PROTESTO. CAUÇÃO. DISCRIÇÃO JUDICIAL. A EXIGENCIA DE CAUÇÃO, NO CASO DO ART. 804 DO CPC, E UMA FACULDADE DO JUIZ. PRECEDENTE. RECURSO NÃO CONHECIDO." (REsp n. 140386/RS - Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar)
É da jurisprudência:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO - MEDIDA CAUTELAR - LIMINAR - PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES - REALIZAÇÃO DE CIRURGIA CARDIOVASCULAR - PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO - FACULDADE DO JUÍZO - Comprovados os requisitos ensejadores à concessão da medida liminar, escorreita a decisão que a deferiu. Conforme preceitua o art. 804 do CPC, ao deferir liminar em processo cautelar, é facultado ao juiz condicioná-la à prestação de caução, podendo, até mesmo, dispensá-la ao aquilatar sua desnecessidade, diante do caso concreto. (TAMG - AI n. 0473569-5 - Rel. Juiz Domingos Coelho)
Portanto, porque facultativa e não obrigatória, a fixação da caução dependerá das peculiaridades do caso concreto, ficando a critério do julgador, apenas, independentemente da oitiva ou não da parte contrária. No caso dos autos não restou verificada a necessidade da medida.
2.4. Antecipação da tutela
Acerca da antecipação dos efeitos da tutela, reza o art. 273 do Código de Processo Civil:
"O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.
§ 1º. Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu convencimento.
§ 2º. Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.
§ 3º A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4o e 5o, e 461-A.
§ 4º. A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada.
§ 5º. Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento.
§ 6º. A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso.
§ 7º. Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado."
A respeito, extrai-se da lavra deste relator:
"A antecipação de tutela pretendida só poderá ser deferida, caso sejam atendidos os requisitos do art. 273 do Código de Processo Civil.
A cognição sumária deve conferir ao julgador elementos suficientemente seguros ao embasamento da decisão interlocutória, evitando-se, assim, prejuízo às partes.
A reintegração de posse do imóvel à ambas as partes, poderá deixar de ser concedida, caso inexistam provas suficientes a amparar a liminar possessória almejada." (AI n. 02.023542-9)
Não discrepa o entendimento desta Colenda Câmara:
"Para a concessão da tutela antecipada indispensável a presença de prova inequívoca que firme o convencimento da verossimilhança das alegações, bem como o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (CPC, art. 273, I). Ausentes tais requisitos, o indeferimento, ou pelo menos o sobrestamento, do provimento é medida que se impõe." (AI n. 03.006432-0 - Rel. Des. José Volpato)
In casu, nesta fase de cognição sumária, possível identificar-se o preenchimento dos requisitos do artigo supra.
Relativamente à prova inequívoca do direito alegado, as fotos colacionadas aos autos (fls. 29/31 e fls. 50/51) não deixam dúvida ter sido a obra edificada próximo ao muro divisório das propriedades.
No que tange à verossimilhança das alegações e à possibilidade de dano irreparável ou de difícil reparação, restaram evidenciadas nos autos, pois a benfeitoria construída pelos agravantes, caso permaneça no estado em que se encontra, poderá causar danos ao imóvel dos agravados, dada a proximidade do telhado em relação ao muro divisório dos terrenos, não permitindo o adequado escoamento das águas pluviais.
Portanto, porque reunidos os requisitos legais à antecipação dos efeitos da tutela, não há razão à reforma da decisão agravada.
Por todo o exposto, afasta-se a preliminar argüida e, no mérito, nega-se provimento ao recurso.

III -DECISÃO:
Nos termos do voto do relator, decidiu a Câmara, por votação unânime, afastar a preliminar argüida e, no mérito, negar provimento ao recurso.
Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Marcus Tulio Sartorato e Jorge Schaefer Martins.

Florianópolis, 07 de outubro de 2005.

Wilson Augusto do Nascimento
PRESIDENTE E RELATOR

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