A preocupação com a possibilidade de haver decisões conflitantes no juízo criminal e no juízo cível, inspirou os legisladores para introduzir no Código Civil a regra do art. 200: "Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva". Com esse mecanismo atende-se à prevalência do juízo penal sobre o cível, no que se refere á apuração do delito e da responsabilidade de seu agente. Se a prescrição civil acontecesse antes do encerramento do processo criminal, a condenação do acusado perderia a força do título executivo civil. O delinqüente sofreria a sanção penal, mas não teria de indenizar o dano da vítima ou de seus dependentes. Foi para evitar que isso acontecesse e que sempre o condenado no crime tivesse de sujeitar-se, também, ao dever de reparar o dano civil, que o art. 200 do CC/2002 veio impedir que a pretensão civil prescrevesse antes do julgamento definitivo do processo-crime. Transcreve-se, abaixo, v. acórdão prolatado pela Segunda Câmara de Direito Público do TJSC e da lavra do eminente Desembargador Newton Trisotto, que muito bem interpreta e aplica o dispositivo legal alhures enumerado.
Data: 27/09/2006
Acórdão: Apelação Cível n. 2004.036924-3, da Capital.
Relator: Des. Newton Trisotto.
Data da decisão: 15.03.2005.
EMENDA: RESPONSABILIDADE CIVIL - DANO MORAL - PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO INDENIZATÓRIA
Prescreve em cinco anos, contados da data em que poderia ter sido proposta a actio, pretensão indenizatória contra a Fazenda Pública (Decreto 20.910/32, art. 1º).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.º 2004.036924-3, da Comarca da Capital (1ª Vara da Fazenda), em que é apelante Andrea Maria Vieira Bleyer e apelado o Estado de Santa Catarina:
ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Público, por votação unânime, negar provimento ao recurso.
Custas na forma da lei.
I -RELATÓRIO:
Andrea Maria Vieira Bleyer ajuizou "ação ordinária de indenização" contra o Estado de Santa Catarina, narrando na petição inicial:
"A autora exerce a Advocacia neste Estado, tendo escritório na cidade e comarca de Brusque. Em nenhum momento de sua atividade profissional, que é intensa, teve sua reputação profissional abalada por qualquer ato ou fato que tenha dado causa ou mesmo por ato de terceiro.
No entanto, para surpresa sua, em março de 1996, o Dr. João Carlos von Hohendorf, à época Procurador Geral do Estado, compareceu pessoalmente ao Fórum da Comarca de Brusque e, no Cartório de Distribuição, na presença de várias pessoas, disse em voz alta, para que todos ouvissem, que estava ajuizando ação penal contra a Autora porque a mesma havia se apropriado indevidamente de verbas pertencentes ao Estado na qualidade de Advogada credenciada para a cobrança da dívida ativa estadual.
Tal fato, de extrema gravidade, repercutiu na vida profissional da Requerente, causando-lhe um sem número de situações constrangedoras. Assim, por exemplo, foi questionada pela maioria dos Advogados da Comarca sobre o fato que lhe estava sendo imputado. Foi também submetida ao vexame de ter sido esse fato alvo de investigação por parte de uma empresa de grande porte à qual prestava serviços jurídicos (Quimisa S/A), tendo que prestar esclarecimentos em reunião da respectiva Diretoria. Teve também que dar explicações a diversas pessoas físicas e jurídicas cujas dívidas fiscais foram cobradas pelo seu escritório. Até mesmo, nas suas relações familiares e de amizade o fato repercutiu negativamente, constrangendo-a sobremaneira, ressaltando-se que, ainda hoje, há quem faça comentários sobre o corrido
O Dr. João Carlos von Hohendorf, agiu em nome do Estado e, induvidosamente, agiu com culpa porque, de forma temerária, acusou a Autora publicamente de ter exercido atividade criminosa quando era credenciada para a cobrança da dívida ativa do Estado. Foi temerária e, por isso, culposa, a atitude do então agente estatal, porque, não havia qualquer delito a ser punido, como assinalou o Promotor de Justiça, Dr. Eroni José Salles, em parecer a seguir reproduzido. Foi temerária e, por isso, culposa, porque antes mesmo da conclusão do Inquérito, atribuiu a prática de crime por parte da Autora." Com a ação aforada, pretende que seja o réu condenado a indenizar os danos morais causados por seu agente.
Ofertada a contestação (fls. 144/163) e ouvido o representante do Parquet (fls. 171/176), a Juíza Ana Luisa Ramos Bornhausen julgou extinto o processo. Para Sua Excelência, prescreveu a pretensão indenizatória da autora (fls. 177/180).
Inconformada, a vencida interpôs apelação, na qual rebate os fundamentos do veredicto (fls. 186/188).
O apelado pugna a sua confirmação (fls. 191/196).
Para o eminente Procurador de Justiça Antenor Chinato Ribeiro, não há na causa interesse a justificar a intervenção do Ministério Público (fls. 200/202).
II -VOTO:
1. Dos termos da petição inicial se infere - para mim, estreme de dúvida - que o dano moral teria origem no fato de o Dr. João Carlos von Hohendorf, então Procurador-Geral do Estado, no mês de março de 1966 ter declarado, "em voz alta, para que todos ouvissem, que estava ajuizando ação penal contra a Autora porque a mesma havia se apropriado indevidamente de verbas pertencentes ao Estado na qualidade de Advogada credenciada para a cobrança da dívida ativa estadual". Na petição inicial, o inquérito policial é apenas referido.
No recurso, sustenta a apelante que "o ato lesivo não se restringe à ação verbal do então Procurador Geral do Estado, mas estende-se por todo o período em que tramitou o Inquérito Policial, começando a correr o prazo prescricional da data em que o mesmo foi arquivado, ou seja, 20 de dezembro de 1996, quando o Estado-Réu reconheceu a inocência da Apelante" (fl. 187).
O inquérito policial não foi instaurado a pedido do Estado de Santa Catarina, mas do Promotor de Justiça, em 10.10.95, à vista dos fatos denunciados pelo Procurador Moacir Frassetto. Cumpre destacar, limitou-se este a postular que fosse dada "vista do presente feito ao representante do Ministério Público para que, se assim entender, promova a competente ação penal por crime de usurpação de função pública o mesmo de estelionato (art. 171 do Código Penal Brasileiro) contra ANDRÉA MARIA VIEIRA BLEYER" (fl. 107).
Estabelecida a premissa de que o ato ilícito teria ocorrido em março de 1996 e tendo em conta que a ação foi aforada tão-somente em setembro de 2001, é forçoso concluir que a pretensão indenizatória encontra-se prescrita, porquanto, conforme o Decreto 20.910/32, "as dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual e municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originaram" (art. 1º).
Ainda que se desprezasse a premissa acima fixada, impor-se-ia a confirmação do veredicto pelas razões que seguem:
1.1. Para a apelante "o ato lesivo não se restringe à ação verbal do então Procurador Geral do Estado, mas estende-se por todo o período em que tramitou o Inquérito Policial, começando a correr o prazo prescricional da data em que o mesmo foi arquivado, ou seja, 20 de dezembro de 1966, quando o Estado-Réu reconheceu a inocência da Apelante" (fl. 187).
No Superior Tribunal de Justiça predomina o entendimento de que "o prazo prescricional da ação de indenização proposta contra pessoa jurídica de direito público é de cinco anos (art. 1º do Decreto n. 20.910/32). O termo inicial do qüinqüênio, na hipótese ajuizamento de ação penal, será o trânsito em julgado da sentença nesta ação, e não a data do evento danoso, já que seu resultado poderá interferir na reparação civil do dano, caso constatada a inexistência do fato ou a negativa de sua autoria" (REsp n.º 442.285, Min. Franciulli Netto, julg. em maio/03; AgRgAI n.º 441.273, Min. João Otávio de Noronha, julg. em março/04; REsp n.º 622.117, Min. José Delgado, julg. em maio/04).
Essas decisões revelam a preocupação com a possibilidade de haver decisões conflitantes no juízo criminal e no juízo cível. Por certo nelas se inspiraram os legisladores para introduzir no Código Civil a regra do art. 200: "Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva".
O "fato que deva ser apurado no juízo criminal" há de ser o mesmo constitutivo do direito vindicado ou a ser vindicável no juízo cível. Exemplifico: instaurado inquérito policial e, depois, ação penal para determinar a responsabilidade de policial pela morte de detento, o prazo prescricional dos seus herdeiros ou sucessores para exercer pretensão visando a reparação dos danos passa a fluir tão-somente do trânsito em julgado da sentença, não tendo relevância se absolutória ou condenatória. O "fato que deverá ser apurado" será o mesmo em ambos os processos - cível e criminal: culpa do agente da pessoa jurídica de direito público pelo dano.
Recorro à doutrina para reforçar a assertiva:
"A responsabilidade civil é independente da criminal (art. 935), de sorte que para a vítima do crime, ou seus dependentes, demandarem a competente indenização, não há necessidade de aguardar o desfecho da ação penal.
No entanto, há casos em que o julgamento criminal interfere no plano da responsabilidade civil: a) a condenação criminal, transitada em julgado, independente de qualquer ação civil, tem força de título executivo judicial no cível (CPC, art. 584, II, CPP, art. 63); b) negada a autoria do delito ou reconhecida a excludente de criminalidade, não se poderá discutir a respeito desses fatos no cível (C. Civ., art.935, 2ª parte; CPP, arts. 66 e 67).
Dessa maneira, embora se dê, em princípio, a independência entre o criminal e o cível, há, em muitos casos, uma intercomunicação entre as duas jurisdições e, às vezes, o decidido no processo penal prevalece na esfera civil também.
Daí a regra do art. 200 que manda suspender a prescrição quando o fato causador da pretensão civil constituir crime, que, por isso, deverá ser objeto de apuração criminal. A suspensão, no entanto, só terá lugar quando a sentença penal não acontecer antes do termo do prazo prescricional civil.
Não quer dizer o dispositivo em tela que a prescrição só comece a fluir depois do trânsito em julgado da condenação criminal. O que se deduz do preceito é que a prescrição correrá desde o delito, mas não se encerrará enquanto o processo penal estiver pendente.
Na verdade o que se suspende é o termo final da prescrição, que ficará protelado no aguardo do desfecho do processo em torno do mesmo fato discutido no cível.
Com esse mecanismo atende-se à prevalência do juízo penal sobre o cível, no que se refere á apuração do delito e da responsabilidade de seu agente. Se a prescrição civil acontecesse antes do encerramento do processo criminal, a condenação do acusado perderia a força do título executivo civil . O delinqüente sofreria a sanção penal, mas não teria de indenizar o dano da vítima ou de seus dependentes.
Foi para evitar que isso acontecesse e que sempre o condenado no crime tivesse de sujeitar-se, também, ao dever de reparar o dano civil, que o art. 200 veio impedir que a pretensão civil prescrevesse antes do julgamento definitivo do processo-crime.
Por outro lado, uma vez obtida a condenação penal, o prazo prescricional começa a correr por inteiro, visto que em se tratando de execução de sentença o prazo é igual ao da ação, mas não é o mesmo. Refere-se à prescrição da execução (pretensão executiva) e não mais à ação condenatória (pretensão exaurida com o julgamento do processo primitivo) (v. comentários ao art. 193)" (Humberto Theodoro Júnior, Comentários ao novo código civil, Forense, 2ª ed., 2003, v. III, tomo II, p. 246-8).
"Com efeito, muitas vezes, determinados fatos geram repercussões tanto no juízo civil, quanto no criminal, correndo processos simultaneamente que poderiam gerar, inclusive, sentenças contraditórias, caso a sentença civil seja prolatada antes do penal.
Na hipótese de o sujeito haver cometido um homicídio, por exemplo, a despeito da relativa independência entre a jurisdição penal e a civil, enquanto não houver sentença criminal definitiva a prescrição não correrá contra os herdeiros da vítima (credores da reparação civil).
Outro exemplo muito comum é quando se despede um empregado por falta grave de improbidade, havendo sido dado início também a persecução criminal. Enquanto pendente a discussão no juízo penal, não correrá a prescrição para demandas cuja causa de pedir próxima seja a acusação de improbidade. Isso pode ser extremamente útil para uma cognição exauriente da matéria e uma solução integral da lide, pois se buscará mais a verdade real do que a realidade formal e muitas vezes apequenada de uma reparação puramente pecuniária.
Por fim, saliente-se que a suspensão da prescrição em favor de um dos credores solidários somente aproveitará aos outros se a obrigação for indivisível, consoante já disciplinava o art. 171 do CC-16, cuja regra vem repetida no art. 201 do CC-02" (Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo curso de direito civil, Saraiva, 2002, 2ª ed., p. 495-6).
"Tendo em vista que a sentença penal condenatória constitui título executivo judicial (CC, art. 935; CPC, art. 584, II, CPP, art. 63), o Código de 2002 introduz, como inovação, na seção que trata das causas que impedem ou suspendem a prescrição, a seguinte regra: Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva" (Carlos Roberto Gonçalves, Principais inovações no código civil de 2002, Saraiva, 2002, p. 33).
1.2. No caso em exame, foi requerida a instauração de inquérito policial para apurar a responsabilidade da autora por ter "se apropriado indevidamente de verbas pertencentes ao Estado na qualidade de advogada credenciada para a cobrança da dívida ativa estadual" (fl. 3). Se algum título executivo viesse a ser constituído o seria em favor do Estado de Santa Catarina. Os fatos a serem investigados no inquérito policial são diversos daqueles que constituem o fundamento do direito invocado pela autora.
1.3. Sabendo-se que o dano moral "é o prejuízo resultante de ofensa à integridade psíquica ou à personalidade moral, com possível ou efetivo prejuízo do patrimônio moral" (Cunha Gonçalves, Tratado de direito civil, Max Limonad, 1ª ed., 1957, tomo II, vol. XII, p. 540), e que pode resultar "de ofensas à honra, ao decoro, à paz interior de cada um, às crenças íntimas, aos sentimentos afetivos de qualquer espécie, à liberdade, à vida e à integridade corporal" (Wilson Melo da Silva, O dano moral e sua reparação, Forense, 1983, 3ª ed., p. 11), é forçoso concluir que, em casos com o sub judice, o exercício da pretensão indenizatória nenhuma dependência guarda com o resultado do inquérito ou da ação penal que dele pudesse resultar. Os efeitos de eventual ofensa "à honra, ao decoro, à paz interior [..], às crenças íntimas, aos sentimentos afetivos" da autora não ficaram sobrestados com a instauração do inquérito policial ou não brotaram com o seu arquivamento. Data venia, não poderia a autora aguardar o arquivamento do inquérito policial ou a sua absolvição no juízo criminal, se instaurada a ação penal, para só depois reclamar indenização por dano moral. Entendimento contrário importaria em se reconhecer que o direito à indenização decorreu do fato de o inquérito policial ter sido arquivado e não da sua instauração, a pedido do Estado de Santa Catarina.
Reconheço que a quaestio juris é controversa. Há precedente do Superior Tribunal de Justiça que, aparentemente, respalda a pretensão da autora:
"1. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.
2. É assente na Corte que a coisa julgada na instância penal constitui o termo inicial da contagem do prazo de prescrição da ação de indenização em face do Estado. Precedentes: AERESP nº 302.165/MS, Primeira Seção, Rel. Min. Peçanha Martins, DJ 10/06/2002; AGA 441.273/RJ, 2ª T., Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ 19/04/2004; REsp 254.167/PI, 2ª T., Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 1/02/2002; REsp 442.285/RS, 2ª T., Rel. Min. Franciulli Netto, DJ 04/08/2003; AGREsp 347.918/MA, 1ª T., Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 21/10/2002.
3. Funda-se a jurisprudência no fato de que nesses casos o termo a quo é o trânsito em julgado da sentença condenatória penal, porquanto a reparação do dano ex delicto é conseqüente, por isso que, enquanto pende a incerteza quanto à condenação, não se pode aduzir à prescrição, posto instituto vinculado à inação.
4. Isto porque 'se o ato ou fato danoso está sendo apurado na esfera criminal, com ilícito, em nome da segurança jurídica aconselha-se a finalização, para só então ter partida o prazo prescricional, pelo princípio da actio nata.' (REsp 254.167/PI).
5. In casu, versa hipótese de arquivamento de inquérito policial, por isso que o autor alegou ter sido preso ilegalmente, indiciado, mas não chegou a ser ajuizada a competente ação penal.
6. Nesta hipótese, o termo a quo da prescrição da pretensão indenizatória moral conta-se da data do arquivamento do inquérito policial, inaplicando-se, como evidente, o Código Civil com eficácia retroativa a fatos ocorridos antes de sua entrada em vigor.
7. Ademais, é diversa a hipótese da ação de indenização calcada em reparação de dano ex delito e ação de dano moral pela veiculação de representação penal arquivada.
8. Recurso especial a que se nega provimento" (REsp n.º 618.934).
Para melhor compreensão do litígio que originou esse recurso, transcrevo excertos do relatório e do voto do Ministro Luiz Fux:
"Consta dos autos que o ora recorrente ajuizou ação de indenização por danos morais contra o Estado de Santa Catarina, alegando ter sido preso ilegalmente, mediante flagrante preparado, sendo indiciado pelo crime de sonegação fiscal, sem que ficasse provada a autoria e a prática do delito, o que resultou no arquivamento do inquérito policial a pedido do Ministério Público.
O juízo de primeiro grau reconheceu a prescrição da pretensão, sob o fundamento de que:
'Pela leitura da inicial se verifica que o fato (prisão) ocorreu em 131992 (fls. 03). O inquérito policial originado da suposta prisão ilegal foi arquivado em 27, logo, não há qualquer dúvida que o lapso prescricional de 5 (cinco) anos passou a fluir a partir de março de 1992. Como a ação foi ajuizada em janeiro de 1998, somente resta acolher a prejudicial de prescrição, pois no mês de março de 1997 se completou o prazo fatal.'
Em sede de apelação, o Tribunal a quo confirmou a sentença impugnada, na forma da ementa acima.
Nas razões do recurso especial, o autor alegou:
a) violação dos arts. 165, 458 e 535 do CPC, porquanto a Corte de origem, instada a se manifestar sobre as questões suscitadas, silenciou, rejeitando os embargos de declaração;
b) negativa de vigência do art. 205 do Código Civil ('A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.'), uma vez que o prazo prescricional na hipótese seria de dez anos, passando a fluir do trânsito em julgado da sentença criminal absolutória, não sendo aplicável a regra do art. 1º do Decreto 20.910;
c) que o acórdão recorrido diverge do entendimento do STJ, no sentido de que 'o termo inicial para a propositura da ação indenizatória por infringência a ilícito penal é do trânsito em julgado da sentença condenatória'.'
'A controvérsia dos autos consiste em definir-se qual o termo inicial do prazo prescricional para a propositura de ação de indenização por responsabilidade civil do Estado. A matéria não é nova no âmbito da Corte, tendo a jurisprudência se firmando no sentido de que o dies a quo, na hipótese de a questão estar também sendo discutida na esfera criminal, é a data do trânsito em julgado da sentença, quer condenatória quer absolutória. Confiram-se os julgados:
[...]
Referindo-se ao mencionado preceito legal, assevera Rui Stoco em seu Tratado de Responsabilidade Civil:
'É a hipótese das chamadas ações civis ex delicto em que o fundamento da reparação encontra-se na prática de ilícito penal e condenação do autor da ação omissão punível.
Portanto, o art. 200 do Código Civil não encerra, propriamente, hipótese de questão prejudicial.
É certo que a redação do preceito é de difícil entendimento e complexa exegese, por falta de rigor técnico.
Mas, em primeira análise, ainda superficial, incluindo no texto tanto quanto está em elipse, entende-se que o sentido da oração é o seguinte: 'Quando a ação (conduta) se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição (no cível) antes da respectiva sentença definitiva.'.
O texto apenas assegurou que a prescrição não corre antes do trânsito em julgado da sentença penal que, portanto, passa a ser o seu marco inicial.
(...)
Em verdade a condição para a suspensão do prazo prescricional não é a natureza da ação no juízo penal, mas sua interposição efetiva.
Todavia, nada impede que o interessado ingresse com a ação civil, independentemente do resultado da ação penal, por força do princípio da independência das instâncias, sendo certo, ainda, que o ilícito civil é um minus em relação ao ilícito penal, de modo que a conduta pode não configurar ilícito penal, mas caracterizar ilícito civil.
Entretanto, se esse interessado preferir aguardar o desfecho da ação penal para, só então, ingressar no juízo cível, apenas para executar o valor da reparação, nos termos do art. 63 do Código de Processo Penal, terá assegurado que o prazo prescricional não terá início até o julgamento definitivo no âmbito criminal.' (São Paulo, Editora RT, 2004, p. 202)
Funda-se a jurisprudência no fato de que nesses casos o termo a quo é o trânsito em julgado da sentença condenatória penal, porquanto a reparação do dano ex delicto é conseqüente, por isso que, enquanto pende a incerteza quanto à condenação, não se pode aduzir à prescrição, posto instituto vinculado à inação.
In casu, versa hipótese de arquivamento de inquérito policial, por isso que o autor alegou ter sido preso ilegalmente, indiciado, mas não chegou a ser ajuizada a competente ação penal.
Nesta hipótese, o termo a quo da prescrição da pretensão indenizatória moral conta-se da data do arquivamento do inquérito policial, inaplicando-se, como evidente, o Código Civil com eficácia retroativa a fatos ocorridos antes de sua entrada em vigor.
Ademais, é diversa a hipótese da ação de indenização calcada em reparação de dano ex delito e ação de dano moral pela veiculação de representação penal arquivada."
Disse que apenas aparentemente o julgado respalda a pretensão da autora porque o inquérito policial foi instaurado e arquivado em março/92 e a ação indenizatória aforada em janeiro/98. Destarte, impunha-se o reconhecimento da prescrição ainda que contado o qüinqüênio do seu arquivamento.
2. À vista do exposto, nego provimento ao recurso.
III -DECISÃO:
Nos termos do voto do relator, negaram provimento ao recurso.
Participou do julgamento o Excelentíssimo Senhor Desembargador Luiz Cézar Medeiros.
Pela douta Procuradoria-Geral de Justiça lavrou parecer o Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Antenor Chinato Ribeiro.
Florianópolis, 15 de março de 2005.
Francisco Oliveira Filho
PRESIDENTE COM VOTO
Newton Trisotto
RELATOR