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CÓDIGO CIVIL INTERPRETADO

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Aplicando o disposto na segunda parte do art. 281 do Código Civil de 2002, segundo o qual - O devedor demandado pode opor ao credor as exceções que lhe forem pessoais e as comuns a todos; não lhe aproveitando as exceções pessoais a outro co-devedor - o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, entendeu que em ação de execução promovida exclusivamente contra devedores solidários, a estes não é lícito oporem ao credor comum, as exceções pessoais que uma sociedade empresária, que não figura no pólo passivo, poderia objetar, como a obtenção de concordata preventiva e a existência de crédito em seu favor. Confira abaixo a decisão monocrática prolatada pela eminente Desembargadora Maria do Rocio Luz Santa Ritta, que traz, ainda, a doutrina do respeitado civilista Silvio Rodrigues.

Data: 05/07/2006

Decisão Monocrática: Agravo de Instrumento Nº 2004.025440-7/0000-00, da comarca de Criciúma.
Relator: Des. Maria do Rocio Luz Santa Ritta.
Data da decisão: 09.09.2004.
Publicação: DJSC n. 11.514, edição de 14.09.2004, p. 26
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Agravantes: Ademir Lemos e outro
Advogados : Carlos Vicente da Rosa Góes e outro
Agravada : Companhia de Gás de Santa Catarina - SCGÁS
Advogados : Orlando Celso da Silva Neto e outro

DESPACHO

Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por Ademir Lemos e Cleusa Maria Costa Lemos contra a decisão da Dra. Juíza de Direito da 2a Vara Cível da Comarca de Criciúma que, em processo de execução deflagrado por Companhia de Gás de Santa Catarina - SCGÁS, autorizou, em apertada síntese e de par com outras medidas, a expedição de ofício endereçado a instituições financeiras para fins de ultimar-se, a pretexto de garantia do juízo, a constrição recainte por sobre 80% das quantias em dinheiro disponíveis nas contas correntes de titularidade dos agravantes/executados, devedores solidários da obrigação documentada no instrumento de confissão de dívidas exeqüendo, cujo importeaproximado monta, hoje, a casa dos R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais).

É o relatório.

Ambicionam os agravantes a obtenção in limine de efeito suspensivo, sustando assim a ultimação da penhora guerreada até quando do julgamento do recurso pela Câmara competente. Patrocinam, para tanto, que a execução se deve promover de sorte a impingir menor lesividade ao devedor (princípio positivado no art. 620 do CPC). Sucede que, ao ver deles, a constrição determinada na origem malfere dito comando, eis que se ofereceram à penhora créditos que a sociedade empresária Vectra Revestimentos Cerâmicos Ltda. (sociedade essa que firmou o contrato exeqüendo, confessando dívidas alusivas ao fornecimento de gás natural e garantido solidariamente pelos executados) detém perante o exeqüente, nos termos de ação revisional ainda em trâmite, afigurando-se despicienda e sobremaneira onerosa a rejeição de tal crédito, com a penhora em numerário.
Sustentam, mais, que a obrigação reclamada inexiste, nos termos dos embargos opostos à execução, e que a sociedade Vectra logrou em seu favor a benesse da concordata preventiva, de modo que os créditos a ela correlatos devem sustar-se, não se podendo exigir de forma avulsa.
A atribuição de efeito suspensivo a agravo de instrumento, conforme noção sobremodo difundida doutrinária como jurisprudencialmente, demanda a presença dos pressupostos cautelares do fumus boni iuris e do periculum in mora. Ambos, porém, não se fazem presentes, no grau necessário, no caso sub studio.
À guisa de delimitação do tema, convém destacar que o âmbito cognitivo do exame recursal é restrito. Circunscreve-se ele no averiguar do erro ou acerto da decisão objurgada. Tanto menos amplo afiguram-se-lhe os contornos naquilo que relativo ao juízo de admissibilidade, com pedido de urgência, ocasião em que importa tão apenas diagnosticar a relevância na fundamentação jurídica e a concretude da superveniência de dano, a ocorrer no interregno temporal que intermedia a análise liminar e o julgamento final. In casu, todavia, é fácil perceber que não se apresenta a esse juízo uma situação concreta de perigo a justificar a sustação imediata do mandado de penhora a expedir-se na origem, como, exempli gratia, a necessidade de disposição da verba virtualmente existente nas contas correntes para fins de honrar obrigações altivas e emergenciais porvir, com vencimento nos próximos meses. O fato de o periculum in mora ser assaz absorto já seria o suficiente para a negativa do efeito suspensivo colimado, prejudicado o fumus boni iuris, requisito cumulativo que é.
De qualquer sorte, é também resgatando o âmbito cognitivo da análise recursal que se vislumbra a inconsistência da fundamentação trazida à baila. A decisão objurgada nenhures se debruça sobre a maior parte das questões aventadas a esse grau de jurisdição, parecendo temerário o respectivo conhecimento originário(supressão de instância). Assim é que a existência de concordata preventiva e a inexistência da obrigação material exeqüenda, para além de consistirem em matérias a serem discutidas em palco processual oportuno (justo por demandarem dilação probatória e cognitiva que refogem ao escopo do processo de execução, processo esse cujo grau de cognição é diminuto e cujo contraditório, diz-se, é apenas eventual, a exercer-se em ação incidental autônoma), não foram, nenhures, objeto de análise na decisão agravada. Decerto e em rigor, pois, não merecem maiores detenções.
Note-se que a execução é promovida exclusivamente contra os agravantes, na qualidade de devedores solidários. A sociedade empresária Vectra Revestimentos Cerâmicos não lhe é componente da extremidade passiva.
Nessa conjuntura, de resto, parece excêntrico que os agravantes tencionem opor ao credor comum as exceções pessoais que sobredita sociedade poder-lhe-ia objetar, como a obtenção de concordata preventiva e a existência de crédito em seu favor, correlato ao exeqüendo, a apurar-se em demanda revisional.
Não é outra a conclusão a que se pode chegar à luz do art. 281 do CC/02, dispositivo segundo o qual "O devedor demandado pode opor ao credor as exceções que lhe forem pessoais e as comuns a todos; não lhe aproveitando as exceções pessoais a outro co-devedor".
O emérito civilista Silvio Rodrigues, ao tratar da autonomia das obrigações, a despeito da solidariedade, adota a solução proposta por Ruggiero e Maroi, subdividindo a obrigação em dois prismas: um interno e um externo. No plano interno é que, para o aludido civilista, reside a autonomia das obrigações solidárias, que justifica a norma constante do art. 281 do CC.
Comentando o dispositivo, ministra o autor que "A exceção é um meio de defesa de que lança mão o réu para ilidir ou suspender os efeitos da ação. Algumas são comuns a todos os devedores, tais a de falsidade do título, de prescrição, de pendência de condição, etc; outras são pessoais ao demandado, como a compensação, por exemplo; finalmente, algumas são pessoais aos outros co-devedores.
Ora, a circunstância de na solidariedade se encontrarem várias obrigações autônomas faz com que a ação do credor, cobrando de um dos devedores a prestação inteira, só possa ser sustada através de uma exceção comum a todos, ou pessoal ao excipiente, o que vale dizer que tal ação não poderia ser interrompida pela oposição de exceção pessoal a outro devedor, capaz apenas de repercutir em uma relação jurídica na qual ele não fosse parte" (Parte Geral das Obrigações. São Paulo: Saraiva, 2002, pág. 72).
Assim é que as questões agitadas encontram insuperável óbice, quer por não se haverem perscrutado na decisão, quer por inoponíveis. Particularmente, contudo, uma das argüições foi objeto de cognição sumária: a recusa do crédito oferecido e a ser apurado em demanda revisional. Ocorre que tal questão se acha preclusa, porquanto decidida em despacho antecedente e não impugnado em tempo.
Ademais disso, fácil é perceber que tal crédito inexiste juridicamente, carente que se faz de provimento jurisdicional dando-lhe certeza. Assim, também sob o prisma jurídico o efeito suspensivo impõe-se negado, tanto mais porque a penhora de valores depositados em agências bancárias afigura-se excepcionalmente viável, à míngua de bens outros suficientes à garantia da execução. No caso, a insuficiência dos bens gravados não se discute. O que se requer é unicamente a penhora de um crédito incerto e cuja decisão rejeitando já se acha preclusa.
Forçoso, assim, é manter os efeitos da liminar, na falta da narrativa de situação concreta de perigo e na presença de argüições a que falece legitimidade e que refogem o âmbito cognitivo.

Isto posto, ausentes os pressupostos do art. 558, a que alude o art. 527, III, ambos do CPC, nega-se o efeito suspensivo colimado.
Cumpra-se o disposto no art. 527, V, do CPC.
I-se.

Florianópolis, 09 de setembro de 2004.

Maria do Rocio Luz Santa Ritta
Relatora

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