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CÓDIGO CIVIL INTERPRETADO

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A simples afirmação de cessação das atividades da pessoa jurídica ou a falta de bens para satisfazer a dívida não são suficientes para a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica a que se refere o art. 50 do Novo Código Civil(sem correspondência no Código de 1.916). Sua aplicabilidade exige prova robusta da atuação fraudulenta ou de abuso de poder dos sócios, dado o convencimento de que a insolvência isoladamente não acarreta a aplicação do instituto, condicionado à constatação de efetivo desvio de finalidade(teoria subjetiva da desconsideração), ou confusão patrimonial(teoria objetiva da desconsideração). Conheça um pouco mais sobre a teoria da desconsideração da personalidade jurídica e o posicionamento na sua aplicação que vem se firmando no Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, fazendo a leitura do acórdão abaixo transcrito. Recomenda-se, ainda, a leitura do acórdão prolatado na Apelação Cível n. 2005.006860-5 e que se encontra disponível para leitura nas ocorrências do artigo 50 deste sítio eletrônico, bastante esclarecedor quanto ao ato abusivo no âmbito do direito societário, colacionando as lições de Luiz Rangel de Morais.

Data: 29/05/2006 Acórdão: Agravo de Instrumento n. 2005.005450-3, de Criciúma.
Relator: Des. Gastaldi Buzzi.
Data da decisão: 04.08.2005.
Publicação: DJSC n. 11.744, edição de 30.08.2005, p. 36.

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO DE SENTENÇA RELATIVA À CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA - INSURGÊNCIA DO CREDOR POSTULANDO A PENHORA DE BENS PARTICULARES DE SÓCIOS QUOTISTAS ANTE O FATO DA EMPRESA NÃO POSSUIR PATRIMÔNIO PARA GARANTIR O PROCEDIMENTO EXPROPRIATÓRIO E/OU ESTAR EM INATIVIDADE - INVIABILIDADE - AUTONOMIA ENTRE O PATRIMÔNIO DA EMPRESA E DAS PESSOAS FÍSICAS QUE A COMPÕE - AUSÊNCIA DE ELEMENTOS PARA ENSEJAR A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA - INEXISTINDO PROVA INEQUÍVOCA DA ATUAÇÃO FRAUDULENTA OU DE ABUSO DA PERSONALIDADE JURÍDICA, CARACTERIZADO PELO DESVIO DE FINALIDADE OU CONFUSÃO PATRIMONIAL, NÃO PODE SER ADMITIDA A CONSTRIÇÃO DO PATRIMÔNIO DOS SÓCIOS - EXEGESE DO ART. 50 E ART. 1052, AMBOS DE CC/02 - PRECEDENTES DA CÂMARA - POSSIBILIDADE DO REEXAME DA MATÉRIA FRENTE A PRODUÇÃO DE PROVA DEMONSTRANDO OS PRESSUPOSTOS ESPECÍFICOS PARA DEFERIMENTO DA MEDIDA EXCEPCIONAL - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de agravo de instrumento n. 2005.005450-3, da comarca de Criciúma (2ª Vara), em que é agravante Roosevelt Hanoff e agravada APA Plásticos Ltda.:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Comercial, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
Custas na forma da lei.

I - Relatório:
Trata-se de agravo de instrumento interposto por Roosevelt Hanoff postulando a reforma da decisão proferida em sede de processo de execução movido contra APA Plásticos Ltda., na qual o juízo a quo indeferiu pedido de desconsideração da personalidade jurídica da empresa agravada.
O recorrente alega que a empresta encontra-se desativada, não havendo patrimônio para suportar o pagamento da dívida, impondo o redirecionamento do procedimento expropriatório contra os sócios proprietários, Augusto Eduardo Althoff e Antônio Carlos Althoff.
Negado efeito ativo e não apresentadas contra-razões, os autos vieram conclusos.

É o relatório.

II - Voto:
O agravo merece ser conhecido e não provido.
A insurgência da recorrente diz respeito à pretensão de desconsiderar a personalidade jurídica da agravada, postulando redirecionamento da ação executiva contra os sócios proprietários, Sr. Augusto Eduardo Althoff e Antônio Carlos Althoff, dada a inexistência de bens para garantir a execução, bem como em função da empresa estar desativada.
Segundo se depreende dos autos, a recorrida foi vencida em demanda voltada à anulação de título crédito c/c perdas e danos (fls. 58-61), sendo acionada para adimplemento de um débito de R$ 10.927,19, a título de honorários advocatícios, tendo sido frustada sua citação porquanto a pessoa indicada pelo credor como sócio quotista/responsável, informou à Sra. Oficial de Justiça que apenas prestava serviços na empresa, negando sua qualidade de sócio.
Após outras providências de somenos importância, o credor requereu a desconsideração da personalidade jurídica em razão da inatividade da empresa e inexistência de bens passíveis de constrição, tendo o juízo a quo indeferido o pleito "em face da ausência de provas" (fl.30) justificadoras da medida excepcional, reservando a possibilidade "de reapreciar a presente decisão, na hipótese de o exeqüente colacionar aos autos documentos/provas que amparem a medida extrema" (fl.30).
A respeito da desconsideração da personalidade jurídica, o entendimento consolidado desta Terceira Cãmara Comercial é no sentido de que apenas quando demonstrada a atuação fraudulenta ou abusiva da sociedade, é que tem lugar a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, dado o convencimento de que a insolvência isoladamente não acarreta a aplicação do instituto, condicionado à constatação de efetivo desvio de finalidade (teoria subjetiva da desconsideração), ou confusão patrimonial (teoria objetiva da desconsideração) (cf. Agravo de instrumento n.2004.013741-9, de Chapecó. Relator: Des. Gastaldi Buzzi,j. 02.12.04).
Acerca da matéria em exame colhe-se precedente do conspícuo Superior Tribunal de Justiça:
"A teoria maior da desconsideração, regra geral no sistema jurídico brasileiro, não pode ser aplicada com a mera demonstração de estar a pessoa jurídica insolvente para o cumprimento de suas obrigações. Exige-se, aqui, para além da prova de insolvência, ou a demonstração de desvio de finalidade (teoria subjetiva da desconsideração), ou a demonstração de confusão patrimonial (teoria objetiva da desconsideração)." (Resp 279.273 - SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 04.12.2003)
Este Órgão Julgador também já deliberou sobre a proposição em comento:
"[...] a desconsideração da personalidade jurídica encontra expressa previsão na ordem jurídica pátria, tal como enuncia o art. 50 do CC/2002, o art. 28 do CDC e art. 18 da Lei n. 8.884/94, que dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica.
Deve ser observado, contudo, que todos estes preceitos normativos exigem, conforme já anotado, prova robusta da atuação fraudulenta ou de abuso de poder dos sócios, mesmo porque a agravada é sociedade limitada e, uma vez integralizado totalmente o capital, cessa, em regra, a responsabilidade dos seus integrantes (art. 1.052 do CC/2002)." (AI n. 2003.020981-6, de São Miguel do Oeste, Rel. Des. Gastaldi Buzzi, julgado em 18.12.03).
Na espécie, o agravante lastra sua pretensão em dois fundamentos, consoante anteriormente ressaltado, concernentes: à inexistência de bens para garantir a execução e a inatividade da empresa. Contudo, a hipótese revela que sequer fora encontrada a sede da sociedade, havendo controvérsia sobre quem seriam os verdadeiros sócios responsáveis pelo empreendimento, uma vez que aquele contra quem se dirigiu a citação negou sua qualidade de cotista.
Nesse contexto, verifica-se a inexistência de elementos de convicção seguros para demonstrar a atuação fraudulenta ou abusiva da sociedade, sendo entendimento consolidado na doutrina e jurisprudência majoritárias que "a simples afirmação de cessação das atividades ou a falta de bens para satisfazer a dívida não são suficientes para a adoção do instituto tratado nos autos, posto que é exigida prova inequívoca da conduta dolosa dos sócios administradores" (cf AI n. 2003.003999-6, de Rio do Sul. Relator: Des. Gastaldi Buzzi, j. 11.12.03).
Sobre o tema, também já decidiu este Tribunal:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - Ação monitória - Ajuizamento contra pessoa jurídica - Etapa executória - Pretensão à penhora de bens particulares de sócio - Teoria da 'disregard of legal entity' - Pressupostos não positivados - Negativa judicial - Decisão correta - Insurgência recursal desatendida. Acolhida pretensão monitória contra pessoa jurídica, a circunstância de não dispor ela de bens passíveis de concretizar o crédito reconhecido, não autoriza, por si só, a aplicação da teoria da 'disregard of legal entity', com a penhora em bens particulares de sócio seu. A desconsideração da personalidade jurídica condiciona-se, não apenas à prova da dissolução de fato da sociedade, ou da inexistência de bens em nome da mesma, mas, acima de tudo, à comprovação do cometimento, pelos sócios-administradores, da prática de atos com excesso de poderes ou com infração à lei ou ao contrato social. (AI n. 2002.023753-7, de Tubarão, Rel. Des. Trindade dos Santos)
E, ainda:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - Execução contra empresa comercial - Pretensão à inclusão de sócio no pólo passivo da ação, com penhora em bens particulares do mesmo - Desconsideração da personalidade jurídica - Pressupostos não comprovados - Indeferimento - Decisão incensurável - Recurso desprovido.
A desconsideração da personalidade jurídica de empresa comercial devedora pode ser declarada nos próprios autos da ação de execução contra ela proposta, desde que comprovados, à saciedade, os fatos que justifiquem com suficiência a medida extrema. E a simples circunstância de não terem sido encontrados bens da executada passíveis de penhora, ou mesmo a suspensão de suas atividades, sem dissolução regular, são razões que, independentemente da prova da conduta faltosa do sócio, seja em razão de excesso de mandato, seja em decorrência da prática de atos contrários à lei ou ao contrato social, não justificam a responsabilização pessoal dos sócios da devedora. (AI n. 2002.025985-9, de Joinville, Rel. Des. Trindade dos Santos)
Seguiram o mesmo sentido: Agravo de instrumento n. 00.024392-2, de Tubarão, Rel. Des. Eládio Torret Rocha; Agravo de Instrumento n. 98.008182-3, de Brusque e Apelação Cível n. 2001.025750-5, de Balneário Camboriú, relatados pelo Des. Trindade dos Santos). rel. Des. Trindade dos Santos; Apelação Cível n. 99.020298-4, de São José, rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz; Agravo de instrumento n. 00.002355-8, de Xanxerê. Des. Silveira Lenzi.
Por outro vértice, é de ressalvar que a presente decisão não está negando à possibilidade de aplicação da teoria da "disregard of legal entity", como mecanismo especialmente desenvolvido para tutelar situações em que se utiliza da personalidade jurídica da sociedade para acobertar atos fraudulentes ou em abuso de direito, havendo, inclusive, expressa previsão normativa de sua aplicação em nosso sistema legal, tal como enuncia o art. 50 do CC/02, o art. 28 do CDC e art. 18 da Lei n. 8.884/94.
Contudo, a sua aplicabilidade exige, conforme já anotado, prova robusta da atuação fraudulenta ou de abuso de poder dos sócios, mesmo porque a agravada é sociedade limitada, e, não havendo controvérsia sobre a integralização do capital, de regra, os sócios não são responsáveis pelas dívidas de seus integrantes (art. 1.052 do CC/2002).
Por fim, cumpre enfatizar que o próprio juízo a quo ressalvou a possibilidade da pretensão de desconsideração ser reexaminada, desde que efetivamente demonstrados os pressupostos ensejadores dessa excepcional medida expropriatória. Ante o exposto, o voto é no sentido de conhecer do recurso e negar-lhe provimento.

III - Decisão:
Nos termos do voto do relator, decidiu a Câmara, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
Participou do julgamento, com voto vencedor, o Exmo. Sr. Des. Dionísio Jenczak.

Florianópolis, 04 de agosto de 2005.

Fernando Carioni
Presidente com voto

Marco Aurélio Gastaldi Buzzi
Relator

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