Embora não mencionado na nova redação do art. 1.768 do Novo Código Civil, o companheiro ou convivente, também tem legitimidade para promover a interdição, por extensão analógica ao cônjuge. Conheça mais uma importante decisão prolatada pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina e muito bem redigida pelo Desembargador Ronaldo Moritz Martins da Silva, na qual se constata o relevante papel da jurisprudência nas omissões contidas no atual Código Civil.
Data: 24/05/2006
Decisão Monocrática: Agravo de Instrumento nº 2005.013336-6/0000-00, da comarca de Balneário Camboriú.
Relator: Des. Ronaldo Moritz Martins da Silva.
Data da decisão: 22.06.2005.
Publicação: DJSC n. 11.699, edição de 28.06.2005, p. 24. Agravante : P. C.
Advogado: Geraldo Lauro Schetinger
D E C I S Ã O
Trata-se de agravo de instrumento interposto por P. C., relativamente à decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara da Família, Órfãos, Infância e Juventude da comarca de Balneário Camboriú que, nos autos da "interdição judicial" (processo n. 005.05.050637-9) proposta pela ora agravante em face de H. M., ora agravado, determinou a intimação do procurador da requerente, para, em 10 (dez) dias, emendar a inicial, sob as penas da lei (fl. 10).
Requer a concessão de "efeito suspensivo" ao reclamo (fl. 06).
É o relatório.
O recurso é tempestivo e foi instruído com os documentos indispensáveis, relacionados no art. 525, inciso I, do CPC (fls. 02v. e 09/11), anotando-se que foi concedido à ora recorrente o benefício da assistência judiciária (fls. 02 e 45).
A ausência da procuração pertinente ao advogado do ora recorrido justifica-se pelo fato de que esta ainda não foi citado.
Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade.
A decisão ora impugnada foi proferida nestes termos:
"[...] 1. No caso concreto, não obstante todos os indícios até então colacionados aos autos quanto à precariedade do estado de saúde do interditando, eis que portador da doença de Alzheimer, ao meu sentir, até então existe óbice de ordem processual, por ser a autora, segundo ainda os documentos até então igualmente colacionados aos autos, sua companheira, aliás como a própria assim se reconheceu;
2. Esta situação lhe retira a necessária legitimidade para postular a interdição de seu companheiro, ao menos de momento, eis que o disposto nos incisos do art. 1.768 do CC é taxativo [...].
3. Conforme a própria autora, apesar de serem falecidos os pais do interditando, o mesmo possui filhos, ainda que estes tenham 'suas próprias famílias e residam em outras cidades', razão pela qual intime-se o procurador da requerente, para em dez (10) dias, querendo, emendar esta inicial, sob penas da lei. [...]" (fl. 10).
O artigo 1.768 do Código Civil assim estabelece:
"Art. 1.768. A interdição deve ser promovida:
I - pelos pais ou tutores;
II - pelo cônjuge, ou por qualquer parente;
III - pelo Ministério Público" (grifou-se).
Embora não mencionado na nova redação do aludido dispositivo, o companheiro, em análise preliminar, também tem legitimidade para promover a interdição, em face da equiparação da união estável ao casamento, promovida pela Constituição Federal de 1988 (art. 226, § 3o).
A propósito, Rodrigo da Cunha Pereira comenta:
"Houve, no entanto, a omissão do Código Civil ao deixar de prever, no inciso II, a iniciativa do companheiro ou convivente, devendo, no entanto, ser considerado igualmente capaz de prover a interdição, por extensão analógica ao cônjuge" (Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. vol. XX. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 472).
Walber de Moura Agra, ao definir as formas de constituição da família, leciona:
"[...] A Constituição de 1988 ampliou as formas de constituição da família, reconhecendo a união estável e a família monoparental como entidades familiares.
Até então o casamento era considerado como a única maneira de constituição de uma família. O legislador constituinte buscou atender à realidade social, de modo que o Texto Constitucional pudesse refletir os novos valores da sociedade.
A gênese da família está na união de um homem com uma mulher. Essa união pode ser feita por meio de um casamento [...] ou por meio de uma união estável, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento" (Manual de Direito Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 615) (grifou-se).
Convém registrar que o artigo 1.775, caput, do Código Civil confere expressamente ao companheiro um direito em patamar de igualdade com o cônjuge, qual seja o de ser nomeado curador do outro, quando interdito, diversamente da omissão contida no inciso II do artigo 1.768 do referido diploma legal.
A relação de união estável existente entre as partes está documentada pelo "Instrumento Particular de Constituição de Sociedade de Fato" de fls. 24/26.
Presente, portanto, o pressuposto do fumus boni iuris.
O periculum in mora decorre da possibilidade de ser indeferida a inicial da interdição.
Pelo exposto, demonstrados os requisitos do art. 558 do CPC, DEFIRO o efeito suspensivo postulado.
Comunique-se, COM URGÊNCIA, ao MM. Juiz de Direito.
O agravado ainda não foi citado. Desnecessária sua participação no feito (Theotonio Negrão, Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor, 33a ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 586).
Publique-se. Intime-se.
Após, remetam-se os autos à Procuradoria-Geral de Justiça para manifestação, procedendo-se, a seguir, a redistribuição, na forma do Ato Regimental n. 41/2000 (art. 12, § 4º).
Florianópolis, 22 de junho de 2005.
Ronaldo Moritz Martins da Silva
Relator