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TJSC. Responsabilidade civil. Dano Moral. Protesto indevido. Dívida quitada através de cheques pós-datados. Inexistência de comunicação ao cartório. Obrigação de indenizar. Aplicação do art. 186 do CC/2002. Após a quitação do débito, mesmo através de cheques pós-datados, a comunicação ao cartório para se evitar o protesto é de responsabilidade do credor, ônus não imputável ao devedor, porquanto, no que tange ao protesto, mesmo que se considere o entendimento de que ao devedor se impõe o dever de regularizar sua situação, é indispensável a imediata entrega de carta de anuência ou do título quitado, pelo credor.

Data: 20/08/2007

Acórdão: Apelação Cível n. 2006.025630-6, de Ituporanga.
Relator: Des. Salete Silva Sommariva.
Data da decisão: 07.11.2006.
Publicação: DJSC Eletrônico n. 112, edição de 12.12.2006, p. 44.

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – INDENIZATÓRIA – DANOS MORAIS – PROTESTO INDEVIDO – DÍVIDA QUITADA –RESPONSABILIDADE CIVIL DEMONSTRADA – IRRELEVANTE COMPROVAÇÃO DO ABALO SOFRIDO – DANO MORAL PRESUMIDO – OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR – VALOR DO RESSARCIMENTO EXCESSIVO – QUANTUM MINORADO.
Após a quitação do débito, mesmo através de cheques pós-datados, a comunicação ao cartório para se evitar o protesto é de responsabilidade do credor, ônus não imputável ao devedor, porquanto, no que tange ao protesto, mesmo que se considere o entendimento de que ao devedor se impõe o dever de regularizar sua situação, é indispensável a imediata entrega de carta de anuência ou do título quitado, pelo credor. Assim não agindo o credor, terá de arcar com os prejuízos pelo protesto indevido.
No que concerne à fixação do quantum indenizatório, a paga pecuniária não há que representar um enriquecimento sem causa para quem pleiteia o ressarcimento, mas deve o valor imposto ser suficiente para desestimular o ofensor à reiteração da prática danosa.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível n. 2006.025630-6, da comarca de Ituporanga (2ª Vara), em que é apelante Farroupilha Administradora de Consórcios Ltda. e apelada Werner Dieter Schunemann:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, dar parcial provimento ao recurso para minorar o quantum indenizatório para R$ 9.100,00 (nove mil e cem reais), incidindo a correção monetária a partir da data do acórdão e os juros moratórios a partir do evento danoso (Súmula 54, STJ).
Custas na forma da lei.

RELATÓRIO:
Na comarca de Ituporanga, Werner Dieter Schunemann ajuizou ação de indenização por danos morais em face de Farroupilha Administradora de Consórcios Ltda., ao argumento de que em novembro de 1999, contratou com a ré, um consórcio, em 60 (sessenta) parcelas, firmando, na oportunidade, o respectivo termo de adesão, sendo integrado no Grupo n. 0120, Cota n. 129.0. Asseverou que foi pagando as parcelas, ora em agências bancárias, ora nas Lojas Colombo, conforme autorizado pela ré. Sustentou que em 29.03.2000 foi sorteado e em 31.05.2000 lhe foi entregue a carta de crédito, tendo adquirido um microtrator Arctic Cat Modelo 250cc 4xs, marca Suzuki. Noticiou que após ter adquirido aludido bem continuou a efetuar os pagamentos normalmente como outrora. Aduziu que ao tentar fazer comprar em supermercado, seu crédito foi negado, porquanto seu nome estava inserido no rol de mau pagadores, devido ao protesto de um título no valor de R$ 6.235,66 (seis mil, duzentos e trinta e cinco reais e sessenta e seis centavos), desde o dia 13.08.2002, junto ao cartório da cidade de Farroupilha. Argumentou que na data do protesto não havia nenhuma parcela em atraso. Alegou que no dia 19.09.2002, menos de 60 (sessenta dia) da ocorrência do protesto, que ocorrera em 13.08.2002, este não mais existia, porque a ré, tendo constatado o equívoco, regularizou a situação. Asseverou que a inserção indevida no cadastro de inadimplentes provocou-lhe sérios transtornos de ordem moral, tendo, inclusive, sido encerrada a sua conta bancária. Em razão disso, pleiteou indenização a título de danos morais equivalente a 50 (cinqüenta) vezes o título protestado.
Citada (fl. 32), a ré ofertou resposta em forma de contestação (fls. 33/43), argüindo, em síntese, que o autor adquiriu um plano de consórcio para pagar no dia 18 de cada mês, tendo sido antecipadamente contemplado, porém quitava quase sempre as parcelas em datas diferentes da estabelecida. Acentuou que as parcelas 31 e 32 estavam em atraso e em 07.01.2002 foi emitida correspondência para a regularização do débito, sendo que, em 23.07.2002, pagou as parcelas 31 a 34, através de cheques pós-datados e quando do protesto, ocorrido em 13.08.2002, as parcelas 33 e 34 ainda não estavam quitadas, porquanto a parcela 33 estava vencida desde 18.07.2002. Aduziu que, agindo assim, o autor concorreu para o evento danoso. Postulou, ao final, a improcedência total do pedido inicial.
Réplica à contestação as fls. 62/64.
Em julgamento antecipado (fls. 72/77), o douto togado a quo julgou procedente o pedido formulado na inicial, condenando a ré ao pagamento de indenização a título de danos morais no valor de R$ 18.706,98 (dezoito mil, setecentos e seis reais e noventa e oito centavos). Condenou, ainda, a ré ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação.
Inconformada com a entrega da prestação jurisdicional, a ré interpôs recurso de apelação (fls. 82/88), repisando os argumentos iniciais e insurgindo-se, subsidiariamente quanto ao valor da condenação e da verba honorária, postulando a minoração.
Contra-arrazoado o recurso (fls. 97/100), ascenderam os autos a este egrégio Tribunal de Justiça.

VOTO:
Estão presentes os pressupostos de admissibilidade dos recursos em análise, ensejando decisão de mérito a seu respeito.
A insurreição consiste no fato de o juiz singular ter julgado procedente o pedido indenizatório, sob o argumento de que as parcelas do financiamento em discussão já estavam devidamente quitadas quando da realização do protesto, o que enseja indenização por danos morais, em razão do protesto indevido.
Nesse contexto, em se tratando de responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana (art. 159, CC/1916 e art. 186, CC/2002), para que seja reconhecido o direito à indenização, é necessária a efetiva demonstração do dano, do comportamento ilícito (dolo ou culpa) do agente e do nexo de causalidade entre ambos, ou seja, é imprescindível a comprovação de que o postulante da indenização sofreu prejuízo diretamente ocasionado pela conduta indevida da outra parte.
A esse respeito, Silvio Rodrigues assevera o seguinte:
"(...) para a configuração da responsabilidade civil, é necessária a composição dos seguintes pressupostos: I) ação ou omissão do agente; II) culpa do agente; III) relação de causalidade; IV) dano experimentado pela vítima. (...) Ordinariamente, para que a vítima obtenha a indenização, deverá provar entre outras coisas que o agente causador do dano agiu culposamente." (Direito civil: responsabilidade civil. 24. ed., São Paulo: Saraiva, 1994, p. 14/17)
A regra da efetiva demonstração do dano moral tem se fragilizado ao longo do tempo, de modo que, na sistemática processual vigente, não mais se exige a efetiva demonstração do prejuízo suportado, bastando, à sua configuração, a consciência de que determinado comportamento atinge a moralidade do indivíduo. É o que acontece com a inscrição indevida nos órgãos de proteção ao crédito, quando a mácula creditícia é por todos conhecida.
É pacífico na doutrina e jurisprudência que, em sede de dano moral, a simples inclusão do nome de falso devedor ou sua permanência indevida no órgão de proteção ao crédito é fato gerador de constrangimentos e transtornos na vida do inscrito, que tem seu crédito negado, sendo impedido de realizar atos comerciais, ou seja, provoca dano moral indenizável, independentemente de comprovação de reflexos patrimoniais.
A esse respeito, ensina Yussef Said Cahali:
"(...) tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado, qualifica-se, em linha de princípio, como dano moral; não há como enumerá-los exaustivamente, evidenciando-se na dor, na angústia, no sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente querido falecido; no desprestígio, na desconsideração social, no descrédito à reputação, na humilhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, na depressão ou no desgaste psicológico, nas situações de constrangimento moral." (Dano moral. 2.ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 20/ 21).
No mesmo sentido, é o julgado desta Corte que ora se traz à colação:
"(...) DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO DANO.
Em sede de dano moral, na sistemática atual, não se cogita mais da necessidade de prova do prejuízo. Basta a consciência de que determinado procedimento atinge a moralidade e a tranqüilidade psíquica do indivíduo, para estar configurado o dano. (...)" (AC n. 1999.017298-8, Rel. Des. Silveira Lenzi).
Se assim o é, presumindo-se a ocorrência do dano moral, o reconhecimento do dever indenizatório depende, apenas, da demonstração do comportamento culposo da ré e do liame causal entre essa conduta e o dano psíquico suportado pelo autor.
Tocante ao protesto propriamente dito, tem-se que, de fato, foi indevido. Isso porque, restou incontroverso nos autos que o débito foi quitado em 23.07.2002, pelo autor, através de cheques pré-datados e o protesto se deu em 13.08.2002, após o pagamento do débito.
Nesse passo, ao contrário do sustentado pela ré, se o título foi encaminhado ao cartório para protesto, após a quitação do débito, a comunicação para se evitar o protesto é de responsabilidade do credor, ônus não imputável ao devedor, porquanto, no que tange ao protesto, mesmo que se considere o entendimento de que ao devedor impõe o dever de regularizar sua situação, é indispensável a imediata entrega de carta de anuência ou do título quitado, pelo credor.
É o que se retira do art. 26 da Lei 9.492/97, in verbis:
"Art. 26. O cancelamento do registro do protesto será solicitado diretamente no Tabelionato de Protesto de Títulos, por qualquer interessado, mediante apresentação do documento protestado, cuja cópia ficará arquivada.
§ 1º Na impossibilidade de apresentação do original do título ou documento de dívida protestado, será exigida a declaração de anuência, com identificação e firma reconhecida, daquele que figurou no registro de protesto como credor, originário ou por endosso translativo".
No entanto, in casu, não há provas nos autos de que a ré efetivamente entregou ao autor os documentos necessários para que ele pudesse evitar o protesto.
Nesse passo, tem-se que a recorrente não só omitiu ao apelado o fornecimento dos documentos sobreditos, como também acabou enviando o título quitado, muito embora com cheques pós-datados, à protesto, dando conta de que a ela incumbia a responsabilidade para evitar o protesto dos títulos.
Outrossim, mister frisar que a credora aceitou o pagamento das parcelas ns. 31, 32, 33 e 34 mediante cheque pós-datado e, por isso, não poderia ter deixado levar a cabo o protesto.
Desse modo, verifica-se que a recorrente não tem como se esquivar de sua responsabilidade, porquanto restou hialina a sua falha, sendo cabível o direito à indenização pleiteada por dano moral em decorrência do protesto indevido, mesmo não sendo comprovados os danos dele advindos, por serem eles presumíveis, como já mencionado alhures.
Em caso semelhante já decidiu esta Corte de Justiça:
"APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - COMPRA DE PNEUS - PAGAMENTO A SER FEITO VIA DUPLICATA - NEGOCIAÇÃO DA CAMBIAL ENTRE A APELANTE E TERCEIRO, ANTES DO SEU VENCIMENTO - OBRIGAÇÃO RENEGOCIADA ENTRE A APELANTE E O APELADO - NOVAÇÃO NÃO CARACTERIZADA - PAGAMENTO DO TÍTULO COM CHEQUE PÓS-DATADO - TÍTULO PROTESTADO INJUSTAMENTE - DANOS MORAIS PRESUMIDOS PELO PROTESTO DE DÍVIDA QUITADA - QUANTUM MINORADO, A FIM DE ELIDIR POSSÍVEL ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA - PEDIDO DE CONDENAÇÃO DO APELADO NAS PENAS DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - NÃO CARACTERIZADO - PRETENSÃO NÃO ACOLHIDA - CENTELHA CONSTITUCIONAL DO PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
Em que pese a inexistência do animus de novar o débito, a credora originária aceitou o quitamento por meio de cheque pós-datado e, por isso, não poderia ter deixado que o Banco, com o qual havia negociado duplicata, levasse esta a cabo, o que implicou o protesto indevido do título.
(...)" (AC n. 2004.033586-4, de Concórdia, Rel. Juiz Sérgio Izidoro Heil, j. em 12.05.2005) (Destaquei)
Portanto, o nexo de causalidade entre a negligência da apelada e o desgosto moral experimentado pelo recorrente é evidente, pois não teria sofrido abalo moral se o protesto não tivesse se efetivado mesmo tendo ocorrido a quitação da dívida, em virtude do mencionado erro praticado pelo credor.
Reconhecida a responsabilidade da demandada, analisa-se agora o quantum indenizatório proferido no decisum.
Sobre o valor da indenização é importante frisar que este reveste-se de tríplice função. A primeira é a função reparadora ou compensatória, por intermédio da qual o julgador pretende reconstituir no patrimônio do lesado aquela parte que ficou desfalcada, procurando restabelecer o status quo anterior à ocorrência da lesão, devendo ser fixada, ainda que impossível a reconstituição da integridade psíquica e moral violada. A segunda, é a chamada função punitiva, através da qual se objetiva castigar o causador do dano, como forma de atuar no ânimo do agente, impedindo que prossiga na sua conduta danosa. A quem refira, ainda, a função pedagógica que serve de alerta sobre a ilicitude do fato, desestimulando a prática de atos idênticos por outros membros da sociedade.
Neste sentido, colhe-se do escólio jurisprudencial do Pretório Superior:
"(...) Como é cediço, a indenização por dano moral objetiva compensar a dor moral sofrida pela vítima, punir o ofensor e desestimular este e a sociedade a cometerem atos dessa natureza. Ademais, segundo vem sendo reiteradamente decidido, o valor da indenização por dano moral sujeita-se ao controle desta Corte, recomendando-se que a sua fixação seja feita com moderação. No caso, o valor da verba indenizatória estipulada (R$ 127.737,60), mesmo considerada a capacidade econômica do recorrente, é excessivo. Afigura-se mais justo seja fixada em valor inferior.
É que embora sendo empresário do ramo de cobranças e o recorrente uma banco bem conceituado foge aos parâmetros de fixação do quantum indenizatório, que deve ser moderado e não implicar locupletamento indevido de quem se sente lesado." (REsp n. 331.078/AL, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, j. em 29.04.2002)
Atenta a essa realidade, verifica-se que o quantum fixado (R$ 18.706,98), demonstra-se excessivo ao caso, de modo que, segundo entendimento desta Câmara, mostra-se razoável a fixação da verba em R$ 9.100,00 (nove mil e cem reais), incidindo a correção monetária a partir da data do acórdão e os juros moratórios a partir do evento danoso (Súmula 54, STJ), valor este razoável e não escapa ao bom senso que a Lex Instrumentalis recomenda (art. 335, CPC).
Destarte, dá-se parcial provimento ao recurso para reduzir a verba indenizatória para R$ 9.100,00 (nove mil e cem reais), incidindo a correção monetária a partir da data do acórdão e os juros moratórios a partir do evento danoso (Súmula 54, STJ).

DECISÃO:
Nos termos do voto da relatora, decide a Câmara, à unanimidade, dar parcial provimento ao recurso para minorar o quantum indenizatório para R$ 9.100,00 (nove mil e cem reais), incidindo a correção monetária a partir da data do acórdão e os juros moratórios a partir do evento danoso (Súmula 54, STJ).
Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Sérgio Izidoro Heil e Marcus Túlio Sartorato.

Florianópolis, 07 de novembro de 2006.

Marcus Túlio Sartorato
PRESIDENTE COM VOTO

Salete Silva Sommariva
RELATORA

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