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TJSC. Seguro. Interpretação restritiva. Art. 757 do CC/2002. Por ser o contrato de seguro limitado e particularizado, a seguradora não será compelida a indenizar os eventos que estão expressamente excluídos da cobertura securitária contratada.

Data: 10/08/2007

Acórdão: Apelação Cível n. 2006.041026-1, de Tubarão.
Relator: Des. Fernando Carioni.
Data da decisão: 27.02.2007.
Publicação: DJSC Eletrônico n. 174, edição de 29.03.2007, p. 91.

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA CUMULADA COM INDENIZAÇÃO - CONTRATO DE SEGURO VEICULAR - NEGATIVA DE COBERTURA - DANOS ORIGINADOS EM FALHA MECÂNICA - APÓLICE QUE EXPRESSAMENTE EXCLUI OS PREJUÍZOS DECORRENTES DE DEFEITOS MECÂNICOS - INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA - INDENIZAÇÃO INDEVIDA - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO.
Por ser o contrato de seguro limitado e particularizado, a seguradora não será compelida a indenizar os eventos que estão expressamente excluídos da cobertura securitária contratada.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2006.041026-1, da comarca de Tubarão (3ª Vara Cível), em que é apelante Ayres Elyseu Zanatta e apelada Sul América Companhia Nacional de Seguros:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, negar provimento ao recurso.
Custas na forma da lei.

I -RELATÓRIO
Ayres Elyseu Zanatta ajuizou ação ordinária de cobrança c/c Indenização contra Sul América Companhia Nacional de Seguros relatando que contratou com a ré, em 19-1-2001, seguro de dano do veículo Scânia, ano e modelo 1994, placa BYA4526, conforme Apólice n. 2322337-0.
Informou que, em 27-3-2001, ao descer a serra da Santa, próximo ao município de Guaratuba/PR, os freios do caminhão não funcionaram, vindo o veículo a parar fora da pista em um barranco. Acrescentou que o impacto resultou, entre outros danos, no incêndio do motor do caminhão.
Sustentou que em razão do sinistro acionou a seguradora/ré com o fim de obter o pagamento da indenização securitária; contudo, tal pedido foi negado ao fundamento de que a apólice não previa a cobertura técnica e que os danos ocorridos foram causados pela falta de lubrificação do motor do veículo.
Ressaltou que utilizava o caminhão para fazer fretes, o que proporcionava-lhe um lucro mensal de aproximadamente R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais).
Ao final, requereu a procedência do pedido, pugnando pelo pagamento dos danos materiais no importe de R$ 36.723,90 (trinta e seis mil setecentos e vinte e três reais e noventa centavos); lucros cessantes no valor de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) mensais até o pagamento do seguro; e, ainda, dos danos morais em virtude da delonga no ressarcimento dos prejuízos.
Carreou aos autos os documentos de fls. 6 a 49.
Devidamente citada, a ré ofertou contestação, sustentado, preliminarmente, a necessidade de ser respeitado o limite da apólice do seguro, no caso de uma eventual condenação, sendo inviável o pagamento de valores superiores ao contratado.
No mérito, argumentou que a negativa de indenização baseou-se no fato de o sinistro ter-se dado única e exclusivamente por culpa do requerente, em virtude da falta de manutenção e lubrificação do caminhão.
Ressaltou, ainda, que, conforme manual do segurado, o desgaste, a depreciação e os defeitos mecânicos não são cobertos pela apólice.
Finalizando, pugnou pela improcedência da demanda.
Impugnada a contestação (fls.108 a 110) e realizada a audiência (fl. 136), sobreveio sentença na qual o Magistrado a quo julgou improcedente o pedido, condenando o requerente ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa.
Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação cível aduzindo, em síntese, que as provas apresentadas pela seguradora são meras suposições, não ficando comprovado o verdadeiro motivo do incêndio no motor.
Acrescenta que consta da apólice cobertura de dano resultante de incêndio parcial que danifique o veículo e, uma vez concluído em laudo pericial que a avaria do motor deu-se por motivos desconhecidos, é obrigação da apelada indenizar o segurado.
Devidamente intimada, a apelada deixou de apresentar contra-razões (fl. 180).
Após, os autos ascenderam a esta Corte.

II -VOTO
O conteúdo da postulação há de ser apreciado, porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade recursal.
Busca o apelante a reforma da sentença que julgou improcedente o pedido formulado nos autos da ação ordinária de cobrança cumulada com indenização proposta contra Sul América Companhia Nacional de Seguros, a fim de ser ressarcido da importância equivalente ao conserto do veículo sinistrado, qual seja, R$ 36.723,90 (trinta e seis mil setecentos e vinte e três reais e noventa centavos), e ser indenizado pelos lucros cessantes e danos morais.
Para tanto, sustenta que, após segurar o caminhão Scânia de sua propriedade na companhia ré, conforme apólice n. 2322337-0, referido veículo, conduzido por seu filho, ao descer a serra da Santa, próximo ao município de Guaratuba/PR, "perdeu os freios" vindo a parar fora da pista em um barranco e que o impacto ocasionou, entre outros danos, o incêndio do motor. Contudo, após comunicar à seguradora do sinistro e encaminhar o automóvel para oficina mecânica, a companhia de seguros negou-se a efetuar a cobertura dos prejuízos.
A Seguradora, por seu turno, ao negar o pedido de indenização, alegou que o seguro não possuía cobertura técnica, ao passo que o sinistro está diretamente relacionado com defeitos mecânicos apresentados pelo veículo por falta de manutenção preventiva. Acrescenta que, de acordo com o manual do segurado, o desgaste, a depreciação e os defeitos mecânicos não são cobertos pela apólice.
Da análise da apólice, bem como das condições gerais do seguro contratado, juntados à fl. 36, observa-se que não estão cobertos os prejuízos decorrentes do "desgaste, depreciação pelo uso, falhas do material, e/ou projeto, defeitos mecânicos ou da instalação elétrica do veículo segurado" (letra c, p. 29).
De outro norte, o seguro contratado pelo recorrente prevê que estão cobertos os prejuízos decorrentes de incêndio ou explosão acidental que danifique parcialmente o veículo segurado ou resultem em sua perda total (garantias básicas 03 e 04 A, p. 17 e 18 das condições gerais).
Assim, a matéria controvertida limita-se a verificar se os danos causados no veículo segurado foram ocasionados pelo incêndio acidental do motor ou por desgaste, depreciação pelo uso, falhas do material e/ou projeto, defeitos mecânicos ou da instalação elétrica.
O parecer confeccionado pela seguradora, após a sindicância, concluiu que "o motor fundiu o virabrequim por falta de lubrificação, sendo assim rompeu as bielas avariando todo motor. Na medida que avariou o bloco do motor, derramou óleo lubrificante que estava em alta temperatura no cano de escape que também estava quente, onde constatou-se um início de incêndio [...]" (fl. 94).
Na mesma direção, colhe-se da declaração da Eletro Diesel Batistella Ltda. - Ediba, empresa em que o caminhão foi depositado para o conserto pelo próprio autor (fls. 16 a 20), que as avarias ocorridas no motor n. 3160679, de propriedade de Ayres Eliseu Zanatta, foram ocasionadas pela falta de lubrificação (fl. 99), o que confirma o laudo feito pela seguradora.
Outrossim, o próprio autor na exordial informa que "vinha descendo a serra da Santa e na tentativa de frear seu veículo o mesmo não agüentou, vindo a parar fora da pista no barranco, sendo que com o impacto veio a incendiar a parte do motor, ocasionando danos materiais de elevada monta" (fl. 2).
O boletim de ocorrência, confeccionado a partir das informações prestadas pelo condutor do veículo, descreve o infortúnio da seguinte forma:
Conforme declaração do condutor, e vestígios no local, o V1 após falta de freio, saiu da pista, parando junto ao barranco, na sarjeta (fl. 11).
Presume-se, assim, diante das provas coligidas aos autos, que o motivo que levou o caminhão a perder o freio, gerando o choque no barranco por manobra defensiva do motorista, está devidamente atrelado à falha do motor decorrente da falta de lubrificação de suas peças, o que acarretou a quebra dos seus componentes. Assim, a falha no veículo, por falta de cuidados preventivos na manutenção, foi a causa preponderante para o incêndio ocorrido.
Desse modo, os danos ocasionados no caminhão segurado não estão cobertos pela apólice contratada que exclui expressamente a indenização pelos danos decorrentes de desgaste, depreciação pelo uso, falhas do material ou defeitos mecânicos.
Em casos análogos, manifesta-se a jurisprudência:
SEGURO VEICULAR. DEFEITO MECÂNICO. INCÊNDIO. CAUSA DE EXCLUSÃO DA COBERTURA. PROCESSUAL. REVELIA INEXISTENTE.
[...]
II. Quebra de mancal de biela que rompe o bloco do motor, fazendo jorrar o óleo lubrificante sobre o escapamento e ocasionando surgimento de chamas no compartimento do motor, que por sua vez acarretaram chamuscamento de peças mecânicas. Demonstrada falha mecânica como causa dos danos, não é devida a indenização. É válida a cláusula contratual geral que exclui defeito mecânico da cobertura securitária veicular, não havendo cogitar de falta de informação, até porque esse tipo de seguro, de regra, é feito contra furto, roubo, incêndio e colisão (TJRS, RC n. 71000836833, Primeira Turma Recursal Cível, rel. Juiz João Pedro Cavalli Junior, j. em 20-4-2006).
CONTRATO DE SEGURO. RISCO NÃO ASSUMIDO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA.
Não constando da apólice a assunção de risco relativo a defeito mecânico apresentado pelo automóvel segurado. No caso, quebra de motor. Indevida se mostra a indenização pretendida. Decisão de primeiro grau mantida por seus próprios fundamentos (TJRS, RInom n. 71000580274, de Porto Alegre, rel. Des. Clóvis Moacyr Mattana Ramos, j. em 16-11-2004).
APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE SEGURO. AÇÃO DO SEGURADO QUE PEDE INDENIZAÇÃO POR DANO EM MÁQUINA COLHEITADEIRA. PEÇA DO MOTOR (BIELA) QUE QUEBRA. CLÁUSULA DO CONTRATO QUE PREVÊ COBERTURA APENAS PARA CAUSA EXTERNA DE DANO. DEFEITO HAVIDO NO MOTOR (DEFEITO MECÂNICO). CLÁUSULA NÃO ABUSIVA. CLÁUSULA QUE ESTÁ REDIGIDA DE FORMA CLARA. ALEGAÇÃO DO AUTOR QUE A SEGURADORA AUTORIZOU O CONCERTO DO MOTOR. PROVA DOCUMENTAL QUE DEMONSTRA NÃO TER HAVIDO AUTORIZAÇÃO. SENTENÇA QUE CORRETAMENTE JULGA IMPROCEDENTE A AÇÃO. RECURSO DO AUTOR IMPROVIDO.
É fato inconteste e conhecido que defeito mecânico não é coberto pelo seguro de veículo, que tem por objeto apenas danos oriundos de causas externas (TAPR, AC n. 0220223-3, de Terra Roxa, rel. Des. Marcos de Luca Fanchin, j. em 2-3-2004).
Frisa-se que o art. 757 do Código Civil dispõe que, pelo contrato de seguro, o segurador se obriga a garantir interesse legítimo do segurado contra riscos predeterminados.
A respeito, Jones Figueirêdo Alves acentua:
Sem dúvida que os limites do contrato estarão na conformidade da avença pactuada, a definir os elementos essenciais do objeto do seguro, a saber, a espécie do sinistro, os interesses a acobertar, os bens, as responsabilidades e obrigações, os valores de pagamento do prêmio e do seguro, os direitos e garantias, os riscos assumidos etc. (in Novo código civil comentado, coordenador Ricardo Fiuza, São Paulo, Saraiva, 2002, p. 684).
Domingos Afonso Kriger Filho, por seu turno, ressalta:
Não obstante este reconhecimento da vulnerabilidade do segurado, necessário se faz atentar que esta sua hipossuficiência não pode servir de pretexto para lhe outorgar direitos que vão além dos riscos previamente estabelecidos no contrato, sob pena de se provocar um desequilíbrio na economia em que repousa a operação de seguro assim firmada (in O contrato de seguro no direito brasileiro, Labor Juris, 2000, p. 93).
É da jurisprudência:
Não responde o segurador por riscos não previstos no seguro se a apólice e a proposta de adesão da avença limitam ou particularizam a extensão da cobertura do contrato (Ap. Cível n. 2002.013297-2, de Catanduvas, rel. Des. Luiz Carlos Freyeslebem, j. em 11-9-2003).
Ante o exposto, nega-se provimento ao apelo, mantendo-se incólume a sentença impugnada.

III -DECISÃO
Nos termos do voto do Relator, nega-se provimento ao recurso.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Exmos. Srs. Des. Marcus Tulio Sartorato e Salete Silva Sommariva.

Florianópolis, 27 de fevereiro de 2007.

Fernando Carioni
PRESIDENTE E RELATOR

 

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